Tinha preconceito com instrumental, ainda são poucas bandas que escuto, mas Igapó de Almas, daqui de Natal, é muito legal. Cheguei nesta conclusão após escutar o “A“, primeiro álbum do grupo lançado em 2014. A banda é formada por Walter Nazário, Henrique Lopes, Pedra Leão, Rafael Melo e Artur Porpino. São esses caras da foto acima.
A performance deles pode ser vista a seguir:
O som deles mistura os sons da natureza, o folk e de vários artistas do mundo. Nessa miscelânea pode ser citado: Tom Zé, Amon Tobin, Tortoise, John Frusciante e Uakti. Como tudo começou? De acordo com Lopes, as primeiras gravações começaram em 2011 através da aproximação entre o Walter Nazário e o Pedras. Esse processo foi se dando até 2013, de maneira esparsa, e aí em 2014 saiu o primeiro álbum, chamado ‘’ A “. Mas por que o nome? Não é relacionado em si ao bairro que fica na zona Norte da capital potiguar, mas da palavra indígena.
Em 2015, os integrantes gravaram um dub ‘’ Mardub”, com a presença do Renan Amantéa e do Dante Augusto, no entanto não foi publicado na internet.. “Não se trata de uma experimentação do Igapó propriamente, mas foi um momento de criação bem legal que rolou já tem um tempo e quem sabe no futuro seja lançado, sem nenhum compromisso.”.
“A palavra igapó se refere às matas que se formam no interior de regiões alagadas “, contou Lopes. Na floresta amazônica também existem muitas matas de igapó e o Pedras morou algum tempo no Acre. “Então é um nome que tem relação com as coisas da natureza, os processos orgânicos e ao mesmo tempo é uma imagem se conecta à cidade e que pode ser ressignificada, até mesmo em termos sonoros, aí já entra o próprio som da banda”, complementa o músico, que tem um projeto paralelo chamado Esquizophanque.
A escolha do instrumental veio de uma forma natural e hoje é o foco central nos ensaios e apresentações. Para os integrantes, no entanto, a canção cantada está presente no trabalho, o primeiro álbum tem cinco canções e o próximo também terá algumas composições. É natural que aos poucos passemos a incorporar algumas canções nos shows, como essa perfomance aqui:
Se você viu o primeiro vídeo acima, constatou que eles fogem completamente dos instrumentais: guitarra+baixo+bateria+teclado e utilizam outros instrumentos, como o didgeridoo, um instrumento de sopro aborígene, feito de madeira, no qual o Henrique Lopes garantiu que não é difícil de tocar e é simples para produzir um som.
“A própria condição de existência da banda passa por essa relação com outros instrumentos, sejam orgânicos ( percussões e didgeridoo) ou eletrônicos ( computadores, samplers, sintetizadores). Por exemplo, quando começamos a apresentar o som do Igapó em 2014 acabamos levando pro palco três pcs, uma coisa meio absurda em termos técnicos mas era o que tínhamos disponível para materializar a sonoridade eletrônica ligada ao instrumental mais convencional, o que era algo que estávamos e ainda estamos buscando desenvolver. Muitas bandas fazem isso, não estamos inventando a roda. Cada uma se vira como pode, pois equipamentos não são baratos e aí entra a questão da gambiarra como um componente fundamental dessa procura por instrumentos diferentes, que é na realidade uma procura por outras sonoridades”, explicou o músico.
Ainda para este anos, eles estão produzindo o segundo álbum, intitulado de “Laborioso Vinho”, no qual o Henrique explica o porquê do título: ” A gravação é uma fermentação constante, de ideias, de sonoridades, de visões de mundo, feita de maneira coletiva, através da ação do tempo. No nosso caso, é um labor que gera músicas fermentadas ao invés de músicas instantâneas (risos), sejam instrumentais ou canções. Essa coisa da fermentação está acontecendo o tempo dentro e fora da gente né? No mundo, na sociedade, na vida de maneira geral. O nome faz referência a essa percepção de que certas coisas precisam de tempo para se transformar no que se tornam.
Sobre a música independente, eles foram um dos cabeças da REMUIN (Rede de Música Independente de Natal), que junta várias bandas independentes que querem produzir um som próprio e original, no qual se reúnem semanalmente para espalhar o seu som na capital potiguar e esporadicamente no interior do Rio Grande do Norte.
“Estamos vivendo a época em que o famoso provérbio de Câmara Cascudo sobre ‘’ consagração” vai deixando de ser repetido como mantra entre os artistas locais de diferentes segmentos, o que é motivo de alegria pois evidencia algumas realizações importantes mesmo diante da precariedade vigente para o setor cultural. O fato é que sempre esteve bem claro que Natal é um polo de criação musical dos mais intensos do Brasil e ultimamente isso está mais evidente. Na verdade, não existe uma única solução que resolveria todos os problemas do cenário musical da cidade, que é muito variado. Até o que cada banda ou artista almeja é muito variado. Isso que você chama de “bandas bem sucedidas”não é apenas uma questão musical, é toda uma cadeia de relações funcionando ao mesmo tempo. Mas é preciso saber filtrar as coisas, evitar se espelhar naquilo que você não está buscando. Isso vai além da produção musical mas não se detém exclusivamente na questão investimento, porque achar que o que falta é apenas investimento também gera uma atitude passiva de considerar que está tudo pronto entre nós e o que falta é apenas alguém ou alguma instituição para investir. É preciso correr atrás cotidianamente, se articular coletivamente de modo a buscar expandir potenciais, fazer guerrilha, estudar, sair do lugar comum, não tem outro jeito. É a dor e a delícia do fazer artístico, ainda mais com o cenário político do jeito que está, completamente fudido. Cada um se vira como pode e com tudo se aprende. Logo, não existem fórmulas mas sim diferentes maneiras de agir, de criar conexões, de fazer acontecer. Nós do Igapó ajudamos a criar a , pode-se dizer que é uma plataforma que tem potencial do ponto de vista coletivo, mas é preciso agir”, finalizou.
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