Andando numa noite na Ribeira, mais precisamente na Avenida Duque de Caxias, eu encontro esta seguinte frase em um muro de um estabelecimento com placa de aluga-se:
A Rua é A Pomba-Gira do Absoluto
Assim como esta frase, o Brechando também apresenta várias visões das ruas natalenses e suas histórias.
Aí fiquei me questionando: Quem escreveu esta frase? O que ela quer dizer? Então, eu vi o meu amigo e poeta Victor Hugo Azevedo tirando uma foto com o muro e se referindo ao poeta Roberto Piva, no qual é bastante conhecido pela cena alternativa da literatura e que faleceu em 2010.
A frase não é exatamente um verso de Piva, mas uma adaptação dela. O verso verdadeiro quer dizer: “Eu sou a pomba-gira do Absoluto”.
O poema completo, que está no livro Ciclones (1997), pode ser conferido a seguir:
Poema vertigem
Eu sou a viagem de ácido
nos barcos da noite
Eu sou o garoto que se masturba
na montanha
Eu sou o tecno pagão
Eu sou o Reich, Ferenczi & Jung
Eu sou o Eterno Retorno
Eu sou o espaço cibernético
Eu sou a floresta virgem
das garotas convulsivas
Eu sou o disco-voador tatuado
Eu sou o garoto e a garota
Casa Grande & Senzala
Eu sou a orgia com o
garoto loiro e sua namorada
de vagina colorida
(ele vestia a calcinha dela
& dançava feito Shiva
no meu corpo)
Eu sou o nômade de Orgônio
Eu sou a Ilha de Veludo
Eu sou a Invenção de Orfeu
Eu sou os olhos pescadores
Eu sou o Tambor do Xamã
(& o Xamã coberto
de peles e andrógino)
Eu sou o beijo de Urânio
de Al Capone
Eu sou uma metralhadora em
estado de graça
Eu sou a pomba-gira do Absoluto(ciclones, 1997)
Muita gente fica chocada com a palavra “Pomba-Gira”, mas se você for realmente pesquisar sobre a palavra, a mesma significa uma entidade de cultos Afros, vem aos nossos terreiros para nos auxiliar, orientar, amparar, aconselhar, etc. Ou seja, ela tem mil facetas. Já a palavra “absoluto” vem do latim solutus ab omni re, compreendendo o que é “em si e por si”. Muitas vezes é utilizado como sinônimo de “Total”, “Todo” ou “Pleno”. Portanto, a pomba-gira do absoluto pode ser interpretado como as várias facetas de tudo.
Quer dizer que o Piva considerava um homem de mil e uma faces. Assim como a rua, nenhuma via da cidade é igual a outra, sempre tem as suas facetas. Na verdade, isto é uma interpretação minha, pode ser quem pintou o muro com esta frase pense de outra forma.
Não é a primeira vez que poetas brasileiros inspiraram os muros natalenses, já falamos que o cantor e compositor Cícero teve versos de suas canções espalhadas na Rua Ulisses Caldas, no qual pode conferir este texto aqui.
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