A Gripe Espanhola de 1918 foi considerada uma das pandemias mais mortais da história da humanidade. Durante dois anos, o vírus influenza A do tipo H1N1 (a de 2009 era uma mutação desse vírus) matou entre 50 a 100 milhões de pessoas, quase 30% da população mundial. O nome da pandemia surgiu pelo fato da Espanha ter tido a maior quantidade de vítimas, porém atingiu todos os continentes e no Brasil, chegando a matar o presidente da república Rodrigues Alves. Afinal, como foi a Gripe Espanhola em Natal ? Nada diferente do Coronavírus, sendo que uma época com tecnologias inferiores.
Os primeiros casos no mundo foram registrados, inicialmente, nos Estados Unidos, mais precisamente no Kansas em 4 de Março de 1918, e Nova York em 11 de Março do mesmo ano. Na Europa chegou em Abril de 1918 com tropas francesas, britânicas e americanas, estacionadas nos portos de embarque na França durante a Primeira Guerra Mundial. Em Maio, a doença atingiu a Grécia, Portugal e Espanha. Em Junho, a Dinamarca e a Noruega. Em Agosto, os Países Baixos e a Suécia. Todos os exércitos estacionados na Europa foram severamente afectados pela doença, calculando-se que cerca de 80% das mortes da armada dos Estados Unidos se deveram à gripe.
O Salomão Gomes de Medeiros pesquisou a doença para sua monografia de história na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). De acordo com o pesquisador, como o porto da cidade circulava navios e pessoas do mundo todo era difícil não ser atingido pela pandemia.
Na época, o Diretor Geral da Saúde Pública, Carlos Seidl, enviou um telegrama com o Inspetor de Saúde do Porto de Natal, Januário Cicco, para recomendar algumas medidas de profilaxia, como assepsia da boca e das fossas nasais e o uso de quinino, um analgésico, como preventivo. Na época, o Diretor Geral de Saúde afirmou que não acreditava na eficácia do isolamento e que não se justifica o temor exagerado. Vocês lembram de quem falando isso? Deixarei na entrelinhas.
No entanto, Dr. Januário Cicco foi uma das primeiras autoridades a se manifestaram acerca do assunto. No jornal “A República”, Cicco escreveu um artigo fazendo uma série de recomendações para dotar a população de conhecimentos mínimos necessários para enfrentar a doença, que tantos problemas já vinha causando em outros locais. Nos textos, ele concordava que aquilo era um exagero e apenas era uma gripe comum.
As últimas semanas do mês de outubro de 1918 começaram a repercutir de forma mais intensa de pessoas infectadas por Gripe Espanhola em Natal. O Colégio Imaculada da Conceição (CIC) antecipou o encerramento do ano letivo, as escolas públicas municipais foram fechadas, foi ordenada a desinfecção diária dos mercados da Cidade Alta e da Ribeira, os cinemas tiveram suas atividades suspensas, a liga esportiva suspendeu todos os jogos de futebol que ainda estavam por se realizar naquele ano. Naquele período, Natal entrava em quarentena.
Já para a Arquidiocese, o Bispo de Natal, Dom Antônio Cabral emitiu um recado dizendo que a “Manifestação da enfermidade se constituía numa demonstração de desaprovação de Deus, em relação ao comportamento dos homens, que estavam se tornando cada vez mais libertinos”. Apesar disso, a Igreja Católica recomendara para que os fiéis ficassem em casa nesse período.
Vemos nos noticiários que o Coronavírus está fazendo com que as pessoas fiquem em casas e empresas fechando temporariamente seus negócios. A Gripe Espanhola não foi diferente, fechou as repartições públicas pelo fato do crescimento de pessoas doentes. O Força e Luz desligava a energia da cidade às 23 horas, devido ao déficit de funcionários. Mas, o que eles fizeram para conter a doença na cidade ? Foi só a quarentena ? O que o Governo do Rio Grande do Norte fez ?
Além da quarentena, foram instalados três postos de saúde na Rocas, Alecrim e na Ribeira, cujo terceiro visava atender a população mais pobre. Lá eram oferecidos pequena quantidade de mantimentos, querosene e medicamentes, além das informações das autoridades para poder se prevenir. No entanto, não existem dados reais de quantas pessoas foram atingidas pela Gripe Espanhola e ainda existia uma contradição dos dados oferecidos pelo Governo e noticiado pelo jornal A República.
A presença da pandemia foi anunciada pela primeira vez em “A República” no dia 19 de outubro de 1918. Nesta data foi feita também uma campanha de vacinação contra a varíola no Posto vacínico do Grupo Frei Miguelinho. O interessante é que se convidava a população para se vacinar contra a varíola (Doença que já virou caso de Pandemia), deixando evidente a ideia de essa vacina também contribuía para o controle da Gripe Espanhola.
O pesquisador Salomão Gomes de Medeiros achou um noticiário de “A República”, publicado no dia 19 de novembro, mostrando que o penúltimo mês do ano foi o mais tenso, uma vez que houve o aumento da procura nos postos. “Anteontem procuraram a assistência 242 pessoas, muitas das quais levaram alimentos e remédios para pessoas das suas família. A turma dos escoteiros visitou 44 casas, socorrendo 68 doentes. […] Dos trezentos e tantos doentes, só anteontem faleceram dois, estando todos os demais consideravelmente bem”, dizia o artigo.
Não tomando conta, os pacientes da Gripe Espanhola em Natal eram levados para o Hospital da Caridade Juvino Barreto (Foto acima do título), onde hoje é o Hospital Onofre Lopes.
O declínio da doença começa a aparecer em “A República” em meado de dezembro de 1918. No dia 15 de dezembro o inspetor geral de higiene do estado, dr. Calistrato Carrilho, reabriu os estabelecimentos de diversão que haviam sido fechado como medida preventiva contra a propagação da epidemia na cidade.
A partir dessa data, as notícias vão ser mais raras e anunciar a diminuição da doença. Uma coisa importante a ressaltar que Natal era uma cidade que tinha em torno de 30 mil e estima-se que 1/3 da cidade foi infectado.
Dentre as mortes conhecidas da Gripe Espanhola em Natal, o historiador Rostand Medeiros informou que o funcionário da Estrada de Ferro Central, José Calazans Carneiro, que perdeu dois filhos menores de idade. Já o capitão da polícia, Abdon Trigueiro, informava a morte do seu irmão, o sargento da polícia Othoniel Trigueiro. Ou o falecimento de Alfredo Costa, serralheiro da Ferrovia Great Western, que deixou numerosa família e a comerciário da empresa A. dos Reis & Cia., Miguel Medeiros, que morreu nas dependências do hospital Juvino Barreto e foi enterrado no cemitério do Alecrim.
O desembargador Vicente Simões Pereira de Lemos, ou do comerciante Alexandre de Vasconcelos, ou do professor Tertuliano da Costa Pinheiro também está na lista de mortos pela Gripe Espanhola em Natal.
As camadas mais pobres também faleceram bastante pessoas, mas como foi falado anteriormente, os registros são contraditórios, porém ambos os historiadores acreditam que esse número foi grande, uma vez que Natal não era uma cidade que tinha saneamento básico e boas condições de higiene nas partes mais ricas e muito menos nas regiões periféricas.
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