363 dias depois…Acharam o assassino da vereadora Marielle. Era algo que todos suspeitavam: a milícia estava no meio de todo este crime. A Polícia Civil do Rio de Janeiro prendeu na manhã desta terça-feira (12) dois suspeitos de participarem do assassinato da vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco (PSOL), morta em 14 de março do ano passado. Integrantes da Delegacia de Homicídios e do Ministério Público, responsável por denunciar a dupla à Justiça, deflagraram operação. Um deles é policial militar reformado e o outro é ex-PM. A ação foi feita com grupos reduzidos para evitar chamar atenção. Às 5h, equipes já cumpriam mandados de prisão em endereços dos suspeitos.
Segundo nota divulgada pelo Ministério Público do Rio, um dos presos é o policial militar reformado Ronnie Lessa, 48 anos. Ele é suspeito disparar a arma que matou a vereadora e seu motorista, Anderson Gomes. Gomes levava Marielle e uma assessora de um evento da Lapa, na região central da cidade, para a Tijuca, na Zona Norte. No meio do caminho, em uma área do Centro conhecida como Cidade Nova, um carro emparelhou com o da vereadora e uma pessoa disparou, segundo a polícia, arma automática.
De acordo com o jornal O Globo, Lessa entrou na lista de suspeitos após ser vítima de uma emboscada, em 28 de abril, 30 dias depois do assassinato da vereadora. A suspeita seria que pessoas envolvidas no crime teriam tentado promover uma queima de arquivo. Uma coincidência é que o militar reformado era vizinho de Jair Bolsonaro, atual presidente da República, em um condomínio na zona Sul.
O segundo suspeito preso foi o ex-policial militar Élcio Vieira de Queiroz, 36 anos. Ele estaria dirigindo o carro quando os tiros foram disparados.
Segundo a denúncia, Marielle teria sido morta em razão de sua militância em favor dos direitos humanos. A operação desta manhã foi a primeira com a participação do Ministério Público do Rio, por meio do Gaeco, que é o grupo de combate ao crime organizado. Essa unidade investiga crimes principalmente relacionados às milícias no Rio.
A ação foi batizada de Lume, em referência ao Buraco do Lume, praça no centro do Rio em que parlamentares do PSOL (onde a maior força do partido se encontra dentro da cidade carioca) costumam se reunir para falar de seus mandatos, toda sexta-feira. Os investigadores também identificaram que o policial reformado teria feito pesquisas sobre a rotina de Marielle e sobre eventos que participaria semanas antes do crime.
Além de ter pesquisado a vida não só de Marielle, mas também de Marcelo Freixo (hoje é deputado federal), deputado estadual na época e um dos ativistas em favor dos Direitos Humanos.
Em janeiro, pelo menos cinco pessoas suspeitas de envolvimento nos assassinatos da vereadora foram presas. Entre os detidos estavam um major da Polícia Militar e dois ex-PMs, identificados como sendo o major Ronald Paulo Alves Pereira, o ex-capitão Adriano Magalhães da Nóbrega e o subtenente reformado Maurício Silva da Costa. Mas só agora descobriu quem colocou o dedo no gatilho.
Apesar dos avanços, ninguém respondeu: quem mandou matar a Marielle Franco? Independente de quem apertou o gatilho, existem muitos homens por aí que querem apagar a sua história, no qual deixou um legado, inclusive sendo tema de uma das maiores Escolas de Samba da cidade (Estação Primeira de Mangueira) e estimulou a participação de outras mulheres faveladas na política.
Marielle Francisco da Silva nasceu no Rio de Janeiro, na Favela da Maré, definia como a “Cria da Maré”. Foi mãe aos 19 anos e teve de abandonar os estudos para criar a filha. Não tinha dinheiro para pagar um cursinho com o objetivo de estudar mais e entrar na Universidade Federal. Mesmo assim, mãe solteira, conseguiu uma bolsa na Pontíficia Universidade Católica (PUC). Foi ali que estimulou que outras pessoas como ela a ter acesso à faculdade e a militância começou a dar os primeiros passos. Dentro da PUC fez campanha para o então professor de história, Marcelo Freixo, de quem foi assessora parlamentar antes de se lançar em candidatura própria. Formou-se em Ciências Sociais e, posteriormente, tornou-se mestre em Administração Pública.
Dentro da Câmara dos Vereadores defendia que a revolução ou seria “feminista, classista e com o debate da negritude”, ou simplesmente não existiria. Ainda defendia as causas LGBT, uma vez que estava inserida no grupo. Sempre encarou de frente homens poderosos, no qual muitos se tornaram parlamentares por apoiarem políticos de caráter duvidoso. Ela não tinha medo, mulheres faveladas cresceram com cabeça erguida mesmo com a falta de oportunidade.
Foi executada com três tiros na cabeça. De acordo com a Human Rights Watch, o assassinato de Franco relacionou-se à “impunidade existente no Rio de Janeiro” e ao “sistema de segurança falido” no estado. Marielle criticava ferozmente a intervenção federal no Rio de Janeiro e da Polícia Militar, denunciava constantemente policiais por abusos de autoridade contra os moradores e a presença das milícias, grupo paramilitar que domina algumas comunidades da capital fluminense. Recentemente, ela havia denunciado atrocidades feitas na Favela do Acari, uma das mais antigas do país.
365 dias para cá nada mudou, as armas foram liberadas, negros são mortos todos os dias e há o aumento dos indíces de violência. Sem contar que cresce cada vez mais o número de feminicídios, o crime é que a mulher é morta pelo seu cônjuge ou parente mais próximo, ou seja, pelas consequências da sociedade patriarcal. Para piorar, tentaram a difamar das piores formas possíveis, desde criação de fake news até deputados a ridicularizando em campanhas eleitorais.
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Agora, precisamos ter uma voz mais forte, vinda dos pulmões para saber quem mandou a matar e o porquê ela teve que pagar com vida em nome de direitos que deveriam ser básicos para todas as pessoas.
Recentemente, a cantora pernambucana Doralyce fez uma música questionando sobre o assunto, cujo clipe foi lançado, por coincidência, no dia que os assassinatos foram descobertos. Vídeo faz parte da sua participação no Sofar Sounds Rio de Janeiro, gravado em novembro de 2018. A letra tem uma forte crítica social, denunciando a violência institucional contra o povo preto, pedindo a desmilitarização da polícia e justiça para Marielle Franco.
Doralyce é ativista, cantora, compositora e atriz. Formada em direito pela UniNassau (PE), ainda é produtora cultural e professora de música. A compositora traz as influências rítmicas advindas do sítio histórico de Olinda, representando a força feminina no Maracatu, Coco, Manguebeat, Samba, ijexá, frevo e Maculelê. Se mudou para o Rio de Janeiro, em 2014, seu trabalho se potencializou ao dialogar com a cena teatral carioca, através dos movimentos de ocupação e resistência cultural em que tem expressiva atuação, foi onde teve o contato com a Marielle.
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“O caso de Marielle é um fato social, uma partícula que precisa ser analisada com um microscópio para você entender todo o problema social do Brasil: de onde ele se enraíza, por que ele vem, por que essa sociedade se mantém assim. A gente fala de desmilitarização porque quem sustenta essa sociedade ser assim, quem silencia e mata manifestante é a polícia. Eles que fazem o controle do Estado, da sociedade, para a gente aceitar essa realidade social. Então é muito importante a gente falar sobre isso: Marielle morreu porque ela questionou a polícia. Eu não sei quantas mais de nós serão necessárias mortas para que as pessoas entendam que a polícia está nos matando. Que a polícia mata o povo preto desse país e não importa se é o preto favelado, se é o preto que mora no Complexo do Alemão ou se é a preta quinta vereadora mais votada do Rio de Janeiro. Foi preto, essa sociedade e esse sistema matam. São assassinos. As balas que mataram Marielle são da Polícia Federal. As pessoas que mataram Marielle eram policiais militares. A gente precisa entender essa instituição que a gente sustenta, que a gente fomenta”.
A canção “O Bicho” pode ser escutado a seguir:
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