Assim que terminei um namoro de sete anos, um dos textos que publiquei foi um artigo chamado “Eu quero ter a vida sexual da Cléo Pires”. Três anos depois, te digo a seguinte frase: “eu ainda quero ter a vida sexual da Cléo Pires”. Recentemente, eu ouvi a frase: “Fazia muita piada de duplo sentido e falava demais de sexo”. Isso me deixou irritada pelo machismo. Além disso, eu ouvi indiretamente de um Crush separava as meninas aquelas que mereciam namorar e para fuder.
Fiquei muito puta (desculpa, mas este texto tem palavrão), não pelo fato do término e sim o machismo. Afinal, o que deveria ser um estímulo a liberdade feminina virou o pavor de sua masculinidade.
Deus abençoe o feminismo
Cresci em um ambiente cercado de mulheres, principalmente do lado Paiva da minha família, que falava de sexo, apesar da fiscalização para saber se todas as mulheres eram virgens.
O bom lado da história é que minha avó quebrou tabus, minha mãe e minha tia quebraram outros e as netas continuam quebrando, visto que nenhuma delas estão casadas ou possuem algum filho. Porém, as nossas escolhas individuais são respeitadas, mesmo que eles não gostem.
Há anos tenho uma luta diária chamada liberdade em cultuar o meu corpo. Não importa que eu vista 36 ou 46, eu quero venerar meu corpo e sentir orgulhosa e bonita, além de ter uma grande prazer em se conhecer e ter o direito de liberdade sexual.
Nestes 10 anos, passei por muitas mudanças corporais das mais diversas possíveis, no qual a medida que havia uma mudança, menos referência de pessoas parecidas comigo no cotidiano. No entanto, eu e outras mulheres fomos ensinadas a seguir um padrão é uma fórmula pronta. Infelizmente sacrificamos a nossa saúde para seguir um controle de um corpo que muitas vezes não tem nada a ver com o nosso biotipo.
Meu corpo, minhas regras funciona mesmo?
Inicialmente achei que era paranoia que isso tinha a ver com o patriarcado, mas a medida que a gente fica mais velho e ver que as políticas públicas são decididas em sua maioria por homens, você ver que aquele argumento paranoico tem sentido.
Se hoje a gente acha absurdo o José Serra falar em 98 que Xuxa não era exemplo por ser uma mãe solteira, imagine que até hoje que mulheres com classes sociais de todos os tipos são consideradas escárnio da sociedade por não seguir o padrão namorar>casar>filho.
Xuxa quis ter filho com peguete e isso não tem algum problema. Além disso, ela é a dona do próprio corpo e tinha poder para isso.
Não importa se eu tenho parceiro fixo ou casinho, o importante é eu impor o que me dá prazer. Não só no sexo, mas também por toda a minha vida.
Desde sempre a Educação Sexual é vista como tabu, pois se acredita que isso incentiva os jovens a correr atrás da eliminação de uma virgindade. No entanto, esse argumento muitas vezes é uma forma de ocultar que isso seria a chave para acabar com casos de pedofilia e assédio sexual.
Além disso, a privação sexual é uma forma de prender a mulher e um controle do patriarcado para controlar os seus corpos. Assim, aquela liberdade sexual que a gente ver no pornô é tudo balela, porque aquilo que estamos vendo é a visão de um diretor. Geralmente homem, no qual quer controlar as pessoas sobre sexo. Ou seja, a atriz pornô tem seu corpo como propriedade das produtoras de pornô.
O Machismo nosso de cada dia
Por isso, é muito comum em ouvir coisas como:
1. Homem procura prostituta porque a mulher dele não fez o que ele queria na cama.
2. Mulher só leva chifre porque está errada.
3. A mulher não pode questionar o sexo.
Claro que esses argumentos são balelas, mas estão tão enraizado na nossa cultura que com certeza você já ouviu isso. Seja de uma mãe ou avó falando daquela prima que levou uma galha gigante.
Mas vem o seguinte questionamento: afinal os nossos corpos pertencem a gente?
A pesquisadora Lúcia Scavone, em artigo publicado na Universidade Federal Fluminense (UFF), de Niterói (RJ), fez um estudo a partir de um discurso do que seria o novo feminismo. As pautas que são debatidas na vida da mulher estão cada vez mais aumentando.
Ela diz:
“Constituir-se em sujeito de direito, não foi (é) o suficiente para ultrapassar a dominação, já que “levar a identidade corporificada a sério requeria o abandono do indivíduo masculino unitário, a fim de abrir espaço para duas figuras: uma masculina, outra feminina” (PATEMAN, 1993, p. 329). Isto implicava, também, confrontar-se com os próprios limites da lei, do poder instituído e das relações de dominação e, posteriormente, do reconhecimento das identidades nômades e contingentes. O desencadeamento das práticas de liberdade, expressas nas ações feministas apontadas, contribuíram para o reconhecimento social e jurídico da mulher como sujeito político e de direitos, que, aliás, ainda não se realizou em escala planetária” (p. 10).
Sim, o que ela quis dizer com isso?
Lúcia mostrou que essa pauta da liberdade de escolha dos nossos corpos, principalmente a mulher brasileira ainda é um assunto sem resolução.
Só para vocês tem uma ideia, o aborto para bebês anencéfalos e vítimas de estupro só surgiu em meados de 2010. O atendimento de risco entre a mãe e o feto na década de 80.
O uso do contraceptivo ainda é visto como mal.
Isto mostra que ainda não temos uma liberdade no nosso corpo, ainda querem julgar como gozamos, o que falamos, qual contraceptivo que devo tomar e o pior, escolher como me comporto diante da sociedade.
Não se culpe, revolte-se
Mulheres, ao ler essas declarações, a vontade é se culpar por querer ser quem é. Porém, precisamos debater e expor mais esses assuntos com a finalidade de comentar o que a mulher pode e não pode fazer.
Percebe-se, portanto, uma necessidade de dar à mulher autonomia sobre seu corpo, para que possa, por meio da autodeterminação, usufruir de sua escolha moral.
Finalizo o meu texto com um trecho da Advogada Mônica Ribeiro:
Esse caminho é da culpabilização por uma situação em que, em verdade, a mulher é a vítima, colocando em risco a provedora – que é a mulher, em grande maioria dos lares do Brasil.
Diálogo e políticas públicas
Pressuposto que as leis são escritas com base nos costumes da sociedade, e a postura feminina hoje reflete a dominação masculina, podemos afirmar que existe uma dominação institucionalizada.
Uma vez imbuída da decisão de abortar, deverá então o Estado reconhece-la como legítima para respaldo de garantias e preservação da integridade física, psíquica e moral, pensando numa justiça inclusiva e abrangente, sem marginalização pautada em religião, patriarcado ou desigualdade.
Percebemos que o valor atribuído aos corpos, à vida e consequência disso, a proibição do aborto, dá-se em consequência da cultura, das crenças reproduzidas.
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