Nesta quinta-feira, 8 de março de 2018, vamos dedicar matérias em homenagem ao Dia Internacional da Mulher. A data está ligada, principalmente, ao fato de centenas de mulheres terem morrido carbonizadas em um incêndio numa fábrica têxtil dos EUA em 1857, quando protestavam por melhores condições trabalhistas. Como o blog não nasceu para ser fofo, não vamos entregar flores ou chocolates. Vamos mostrar luta! Mulheres que matam um leão por dia contra a sociedade patriarcal. A primeira matéria é sobre Janaína Lima, que além de lutar contra o machismo, também batalha para acabar com a LGBTfobia, sabendo que o país ainda é um dos que mais mata a população trans e poucas passam dos 30 anos. Mesmo assim, Janaína é feliz e está mostrando que tem muita luta.
A primeira vez que conheci a Janaína foi na militância política, apesar de nunca ter participado de grupos estudantis, eu achava interessante ouvir os debates dentro dos corredores do Setor II. Ela ainda não era a Janaína e mesmo assim era bem atrevida na Faculdade de Jornalismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), mal tinha chegado no primeiro período e já via logo os defeitos do Departamento de Comunicação Social, participara do Centro Acadêmico e depois se tornou integrante do Levante Popular da Juventude.
“Quando entrei no curso, eu senti muito falta de um verdadeiro debate político, comentar sobre o Povo Brasileiro e questionar o capitalismo, que tem em outros (cursos) de humanas, como Ciências Sociais. Todo semestre pensava em trancar”, contou.
Na verdade, a persona Janaína Lima sempre existiu e a mesma afirma isso, só que precisou de uma metamorfose para poder ser apresentada à sociedade. Assim como um lagarto ao se transformar em uma borboleta. Um girino em sapo. Foi na própria militância que ela viu a importância de lutar às causas a favor das mulheres e LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais).
“Mesmo ainda não assumindo para a sociedade como uma pessoa trans, eu sempre defendi a importância de combater a LGBTfobia e o machismo, principalmente na imprensa”, relatou à jovem em entrevista para o Brechando.
Ela não se via como uma repórter, muito menos uma editora. Mas é editora da sucursal do RN do jornal Brasil de Fato, com uma temática mais socialista e que tenta fornecer uma voz para os trabalhadores, representados através do sindicatos e políticos.
“Achava que iria estudar e trabalhar como militante a favor dos direitos humanos, a vida , porém, me fez ser editora de jornal. Estou aprendendo a amar essa função”, disse Janaína Lima, considerada a primeira editora de jornal transexual no Brasil e é natural de Natal-RN.
Ela comanda uma equipe formada por pessoas experientes na luta política, estudantes, acadêmicos e dentre outros. A primeira edição da sucursal potiguar saiu em fevereiro desse ano e já tem o discurso como editora. “Eu quase morri, quando vi que a primeira edição apareceu com erro, quase matei o diagramador (risos), porque a gente queria que ficasse duas linhas. A gente escreve por aqui e imprime na matriz em Recife. Eu estou aprendendo a gostar de ser uma jornalista, é um reaprendizado e gosto de ser desafiada”, explicou.
Agora, o seu sonho é que mais mulheres e homens trans trabalhem na área, não só no jornalismo, mas também em todas as áreas.
“Infelizmente, eu conheço apenas o trabalho de Carol Marra, que é modelo e jornalista trans. Eu sei que tem um rapaz trans que é formado em Rádio e TV na UFRN, no qual gostaria bastante ter um bate-papo. Mas jornalista vinda de universidade pública, acho que tem apenas eu, quero que outras surgem, lutem nos Centros Acadêmicos e que estejam trabalhando”, comentou a jovem.
Mas, como tudo começou? Como ela descobriu ser transgênero? Trans vem do termo transgênero. Refere-se aquelas pessoas cuja expressão social ou identidade de gênero difere daquela tipicamente associada ao gênero que lhes foi atribuído no nascimento (transexualidade). Também designa pessoas que não se identificam com as noções convencionais de homem ou mulher, combinando ou alternando as duas identidades de gênero (não-binário). Janaína disse que sempre sentiu apreço pelo universo feminino, em vestir roupas femininas, brincar de boneca e dentre outras atividades.
Após ter acesso ao computador, na adolescência, ela foi pesquisar o que sentia e começou a conhecer o universo trans. “Hoje o acesso para as pessoas já é difícil, há 10 anos isso era pior. Então, eu achei uma comunidade no Orkut, no qual as pessoas se comunicavam aonde pegar os hormônios, procedimentos para mudar o nome e dentre outras coisas. Me davam dicas, explicavam todo o procedimento. Mas, eu achei melhor esperar entrar na universidade e ter uma independência financeira para começar. Sempre quis fazer comunicação, pois queria fazer um curso que pudesse me expressar e eu sempre fui bem falante. Inicialmente, eu queria trabalhar com moda e cultura.”.
Assim que entrou na faculdade, ela viu que a independência iria demorar mais um pouco e isso a incomodava, foi então que conseguiu desabafar com os colegas sobre os seus sentimentos. “A primeira pessoa que falei da minha condição foi um amigo na minha sala de aula e ele foi o que mais encorajou a fazer transição. Depois juntos fomos ao Levante Popular e somos amigos até hoje”, relembra.
Janaína se transformou em borboleta no final da faculdade, onde teve o direito de utilizar o seu nome social e terminou seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) baseado sobre a educomunicação, temática que trata a relação da utilização dos meios de comunicação em ambiente escolar, no qual a sua última bolsa era sobre a montagem de uma rádio escola nos colégios públicos do estado, onde pode viajar por todo Nordeste e conhecer várias ONGs que trabalham com o assunto.
“Durante esses cinco anos de faculdade, eu sempre fugi do jornalismo em si, fiquei trabalhando com bolsas de pesquisa relacionados aos trabalhos sociais, indo para assentamentos, escolas e dentre outros lugares onde não existe o acesso ao poder público. Hoje vejo que é possível fazer Comunicação Social sem precisar entrar no mercado formal de trabalho e fazer a sua própria estrada”, contou.
Agora o próximo passo é tentar estudar o mestrado e pensa em pesquisar sobre opções de mídias alternativas para combater a hegemônica. “Quero me inscrever como aluna especial”. Nesta semana, ela conseguiu o direito de assistir as aulas para a turma de pós-graduação.
Para o dia 8 de março, Janaína Lima quer que as mulheres ainda lutem por mais representatividade no mercado, inclusive as mulheres trans. Segundo a jovem, o Dia Internacional da Mulher é um momento para ser debatido nas universidade, escolas e, inclusive, ambiente de trabalho. “Nós jornalistas precisamos dialogar com a comunidade sobre o Dia Internacional da Mulher. Aqui no Brasil De Fato terá uma edição especial sobre o que é ser mulher neste Brasil que estamos passando, além de compreender o que é ser mulher.”.
Além disso, a Janaína disse que precisa mostrar a importância da identidade de gênero e como isso é uma luta importante. “Estamos sujeitos à violência o tempo todo, principalmente por apresentar uma imagem contrária o que a sociedade patriarcal quer mostrar diariamente”, finalizou.
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