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Como funciona o único cinema de rua em Natal, o Cine França

cinema rua Natal

Tem uma reportagem especial, mostrando como funciona o único cinema de rua em Natal, conhecida pelos pornôs. Saiba mais no Brechando!

O cinema não é só filme, mas um conjunto de experiências e curiosidades de uma pessoa, principalmente quando este cinema fica numa rua em Natal. Nos últimos 20 anos, as salas que ficavam no Centro de Natal desapareceram, como se fosse uma pandemia mortal em que o vírus da pornografia lhe atingisse e seu último suspiro fosse vender para uma loja de departamento ou ter o prédio simplesmente abandonado.

Mas, o Cine França resiste por ser o único cinema de rua, ter duas unidades no Centro de Natal e ainda mais exibir pornografia bem no coração do Beco da Lama. Mas, qual a diferença entre ele e os cinemas exibidos no shopping? 

O que me chamou atenção não foi os pacotes disponíveis de lubrificantes que estavam lá como se fosse biscoitos, camisinhas ao fundo e a venda de chocolates e biscoitos recheados, mas a quantidade de fotos do homem de bigode no fundo

Diferença quase nenhuma

Eles trazem experiências parecidas. A gente não vai ao cinema apenas para ver o filme, vai para comer pipoca, comprar o ingresso, sentar numa cadeira, ver as pessoas em volta e, por fim, o filme. Se estiver acompanhada, os beijos do cinema podem virar uns belos amassos, como a Rita Lee já falou: 

No escurinho do cinema
Chupando Drops de anis
Longe de qualquer problema
Perto de um final feliz
Se a Deborah Kerr que o Gregory Peck
Não vou bancar o santinho
Minha garota é Mae West
Eu sou o Sheik Valentino
Mas de repente o filme pifou
E a turma toda logo vaiou
Acenderam as luzes, cruzes
Que flagra

Diferentemente dos cinemas de shopping, o Cine França parece assumir que a pegação está válida, visto que a entrada e saída de homens vestindo suas calças e camisas na calçada do cinema gera olhares conflitantes. Um deles foi o meu em toda vida que passeava no Beco da Lama. Entretanto, as portas estavam sempre fechadas e um sábado de boêmia o encontrei aberto.

Com as luzes vermelhas iluminando as janelas, aquele ambiente meio Peep Show e meio cinema de cidade do interior. Gente entrando e saindo, além de transeuntes na calçada. Enquanto isso, estava em um sebo próximo de lá e perguntava se era bastante movimentado ou algo do tipo. Todo mundo sabe que é um cinema pornô, mesmo que tenha uma sinalização de não parecer que exibir este gênero. 


cinema rua Natal

Foi perguntado às pessoas em volta dizer que o local era muito comum para pegação, principalmente entre o público LGBTQIA+ por ser um dos poucos momentos que poderiam ficar na rua sem precisar ter medo de ser agredido na rua ou se arriscar de ser expulso do cinema de shopping ou ainda ser flagrado em um ambiente privado por fazer o banheirão. Basta ver os comentários de avaliação do cinema no Google questionando isso.


“Mulher, lá só tem maricona, deus me livre encontrar um crush ali””, contava um amigo meu em um assunto de bar da vida.  Pior que olhava enquanto a movimentação do Cine Papai, seu nome antigo, eu via que realmente a maioria dos homens eram pessoas entre 30 a 50 anos, sempre saindo com um olhar desconfiado. 

Falando melhor da movimentação

À medida que meus amigos tragavam seu Pine, a gente via o local e ficava maravilhado com os quadros de Charles Chaplin na porta, Marilyn Monroe, Jayne Mansfield e outros astros de Hollywood dos anos 50. “Nossa, será que algum dia eles exibem filmes sem ser pornô?””, pensei sobre este cinema de rua em Natal.

Aí veio a brilhante ideia de entrar por motivos curiosos, mas como a gente poderia entrar? Afinal, eu era mulher e durante os 30 minutos que eu estive na calçada fofocando sobre o cinema não vi ninguém do sexo feminino, muito menos um cartaz de filme pornográfico relacionado ao casal hetéro e de casal do gênero feminino para “justificar minha presença” (aqueles vídeos machistas de achar sexy duas mulheres se pegando e eu sou contra, certo?)  ou outro argumento que parecesse. 

Tanto que próximo aos cartazes de filmes clássicos da era de ouro tinha um biombo para deixar o local bem mais misterioso. Ainda tinha uma mensagem em letras garrafais os ditos “Proibida a entrada de menores de 18 anos”. 

Mas, um pouco acima eu vi um cartaz com um cardápio, oferecendo cerveja, cigarro, refrigerante e entre outros lanchinhos. Olhei para uma amiga minha e disse: “Vou comprar uma cerveja””, prontifiquei. A mesma acenou a cabeça e foi comigo. 

Entrando no Cine França

Subimos o batente bem alto e por trás do biombo tinha uma recepção de luz vermelha, isolamento acústico no teto (vermelho e branco) e logo que batemos o olho, vimos um local que funcionava ao mesmo tempo uma bilheteria e, ao mesmo tempo uma bomboniere, uma lanchonete e central de informações. Fui recebida por um rapaz bigodudo, que tinha em torno de 50 anos de idade e mantinha o porte bem Freddie Mercury. 

Quando viu as duas entrando, você sentiu que ele teve um susto e perguntou o que a gente queria. “Quero uma Heineken. Quanto custa?””, perguntei. Direto ao ponto, ele respondeu que eram nove reais e não queria muita conversa, mostrando um desconforto por estarmos ali. 

Torta de climão no cinema de rua em Natal

Disse que queria e me entregou a lata, enquanto via numa TV de tubo a primeira edição de Pantanal, aquela de 1990. O que me chamou atenção não foi os pacotes disponíveis de lubrificantes que estavam lá como se fosse biscoitos, camisinhas ao fundo e a venda de chocolates e biscoitos recheados, mas a quantidade de fotos do homem de bigode no fundo. 

Logo, entendemos que era o Seu França, como a gente resolveu chamar, e ouvia os clientes lhe chamarem assim. Havia muitas fotos e de todos os ângulos daquele moço, que apresentava uma desinibição ímpar e diferente daquela hora. Como não conseguimos tirar foto de dentro, fiz um desenho para explicar melhor.

“Aceita Pix, o QR Code está aí”, apontou para o cartaz. Perguntei se aquele nome da conta era dele e cortou logo dizendo que não. Enquanto isso um outro homem estava agoniado na fila, a gente ofereceu dar a frente e ele educadamente respondeu que queria apenas um Pine.

Resolvi não entrevistar para que ficasse um clima ruim que já era, mas o lado Moulin Rouge, com autoestima do proprietário e clientes fiéis mostra que a Cidade Alta resiste e conta a sua história de um jeito só dela. 

Comentários

4 respostas para “Como funciona o único cinema de rua em Natal, o Cine França”

  1. Tá em falta lugares de cruising em Natal. Indiquem mais!

  2. Hélcio Pacheco de Medeiros

    Parabéns Lara Paiva pelo trabalho jornalístico investigativo. Assim vamos conhecendo mais de perto a vida concreta da cidade de Natal

  3. Everton

    Adorei o texto !

  4. Bruna

    Que matéria incrível!!!!!!!! Fiquei curiosa com o Cine França e eis que vim buscar notícias no Google para ver como era kkk obrigada pela informação kkkk achei bem completa e me despertou curiosidadesss. Vou acompanhar mais posts do blog. Bjs

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Desenho do ilustrador Um Samurai

Lara Paiva é jornalista e publicitária formada pela UFRN, com especialização em documentário (UFRN) e gestão de mídias sociais e marketing digital (Estácio/Fatern). Criou o Brechando com o objetivo de matar as suas curiosidade e de outras pessoas acerca do cotidiano em que vive. Atualmente, faz mestrado em Estudos da Mídia, pela UFRN e teve experiência em jornalismo online, assessoria de imprensa e agência de publicidade, no setor de gerenciamento de mídias sociais.

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