Para quem começou a trabalhar com jornalismo em 2012, o período de agosto foi literalmente uma aula para saber o que era ética e o que deveria comentar. Além disso, foi uma luta em colocar o que observei sem ter uma interferência de algo superior. A Revolta do Busão foi um período importante, uma vez que abriu meus olhos sobre a posição política e finalmente decidi qual era o meu lado.
Vou contar a história a seguir. E, vamos dividir, por conseguinte, nos tópicos:
- Fora Micarla foi o estopim
- Terceiro ato e o mais importante
- A Revolta do Busão
- Isto levou ao início dos protestos de 2013
Fora Micarla foi o estopim
Tudo começou no Fora Micarla. Um grupo de estudantes protestaram contra a prefeita Micarla de Sousa. Na época, realizou uma série de medidas, como aluguel de prédios exorbitantes, compras fraudulentas, terceirização com contratos estranhos e, por fim, o aumento da tarifa de ônibus sem nenhuma explicação. Foi por causa da alteração da tarifa de R$ 2,00 para R$ 2,20 que estudantes e sindicalistas começaram um movimento na internet que ficou conhecido na imprensa potiguar chamado “Fora Micarla”.
Em janeiro foram mobilizados três protestos contra o aumento do transporte público, em fevereiro foi organizado o Bloco de Carnaval Xô Inseto, na praia da Redinha. O nome era alusão à borboleta, símbolo da então prefeita durante a campanha de 2007. Somente em maio, que estudantes se organizaram através das redes sociais, realizaram um ato com a participação de mais de mil pessoas. Saindo do Midway Mall até o bairro de Ponta Negra, gritando palavras de ordem e convocando toda a população a mostrarem sua insatisfação.
O segundo ato foi caminhar até o finado estádio “Machadão” para criticar as obras na Copa do Mundo de 2014 e a privatização da saúde, enquanto os salários dos servidores estavam atrasados.
Terceiro ato e o mais importante
E no dia 7 de junho começou o terceiro ato de protesto e o mais polêmico. Saindo da Praça Cívica cerca de 200 manifestantes, debaixo de chuva, marcharam pelo centro da cidade até a Prefeitura gritando palavras de ordem. Quando chegaram à Prefeitura, os manifestantes encontraram, como em todos os atos anteriores, a porta fortemente protegida pela Guarda Municipal. De lá, seguiram para a Câmara de Vereadores de Natal. Os manifestantes, encontrando a entrada livre, subiram para o plenário da Câmara, onde lotaram o pequeno espaço dedicado à população. Mais de cem pessoas entraram no local com capacitação máxima de 50 pessoas e outra centenas ficaram do lado de fora, todos gritando palavras de ordem que paralisaram o andamento da audiência pública que acontecia. Os parlamentares não se dignaram a dirigir a palavra aos manifestantes. Após 20 ou 30 minutos, esvaziaram o plenário.
Foi nesse período que os estudantes começaram a acampar na Câmara Municipal. Eles não saíram até desse prosseguimento à Comissão Especial de Investigação (CEI), dedicada a investigar os atos de improbidade administrativa, desvio de dinheiro público e aluguéis e compras superfaturadas por parte da Prefeitura. O acampamento recebeu o nome de “Primavera Sem Borboleta” em referência à Primavera Árabe que acontecia no mesmo ano.
Após uma semana, os manifestantes decidem desocupar e foi criada a CEI para investigar os contratos de Micarla de Sousa.
A Revolta do Busão
A manifestação pode ser considerada a mãe da Revolta do Busão, que surgiu no ano seguinte para criticar o aumento da passagem de R$ 2,20 para R$ 2,40. Além disso, estimulou a onda de protestos que aconteceram no Brasil em 2013. De um lado eram estudantes com muita revolta por conta do valor da passagem e por outro a imprensa focara apenas nos ônibus queimados ou diziam que os policiais reprimiram os estudantes após uma provocação. Foi em agosto de 2012 quando tudo começou e ainda era estagiária quando fui cobrir uma das manifestações. Além disso, ajudou a eleger novas lideranças políticas, como Natália Bonavides, hoje deputada federal, que na época era integrante do Centro Acadêmico de Direito.
Na época eu entrevistei um dos membros, no qual toda a manifestação era organizada por eventos do Facebook e também através de assembleia na universidade. A intenção, contudo, era manter um movimento totalmente horizontal. Ou seja, não havia um líder específico. Na época, eles queriam não apenas um grupo para reclamar da tarifa, mas também de questionar o transporte público.
Após três manifestações, os vereadores de oposição criaram uma medida que derrubasse a sanção da prefeitura em aumentar a passagem.
Os manifestantes conseguiram derrubar Micarla e a passagem
No final de 2012, a prefeita Micarla foi afastada do caso após a justiça acatar o resultado da investigação do Ministério Público da Operação Assepsia, que comprovou que houve desvio de dinheiro entre a prefeita, secretários e donos da empresa que terceirizava os médicos da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Pajuçara e Ambulatório Médico Especial (AME).
Mas, o protesto não parou por aí. Já a passagem, eles conseguiram manter por R$ 2,20 apesar das ameaças do Seturn (representante dos empresários do transporte público) de aumentar para conseguir acordo com o poder público.
Isto levou ao início dos protestos de 2013
O sucesso da Revolta do Busão fez com que outras capitais brasileiras se inspiraram em realizar manifestações próprias contra o aumento da passagem. Como a Polícia Militar repreenderam os manifestantes de forma truculenta, mais pessoas apoiaram as manifestações e o desejo de mudança cresceu cada vez mais. Em junho de 2013, mais de 500 cidades do Brasil se uniram para criticar não só o aumento da passagem, mas também criticar os megaeventos esportivos internacionais (“Não vai ter Copa”, lembra?) e o fim da violência policial.
Tanto que no período era o momento que o país sediara a “Copa das Confederações”. Além disso, um dos comerciais falava sobre “Vem Pra Rua”, que sem querer virou o hino das manifestações.
Apesar de que boa parte das capitais conseguiram conter o aumento de passageiros. Ademais, o movimento trouxe consequências bem pesadas para as eleições gerais de 2014.
Em momentos pontuais, algumas pautas difusas também estiveram presentes. Em geral levadas por pessoas sem conexão com os movimentos sociais e influenciadas pelos oligopólios de comunicação, como a contrariedade à Pec 37, porém eram minoritárias de início e se intensificaram em 2015 com o “Fora Dilma”.
Até hoje questiona-se se os protestos de 2013 valeram a pena ou foi um surto coletivo, mas está na história. Mas, ao mesmo tempo, também ajudou a entrada de jovens na política brasileira, uma vez que houve aumento de adolescentes de 16 anos querendo tirar o título. Sem contar o estímulo da manifestação de secundaristas em 2016 contra a reforma do Ensino Médio.
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