Nos últimos anos, os parlamentares da esfera federal, estadual e municipal têm se discutindo sobre o debate LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros) nas escolas, uma vez que quase todos reprovaram a inclusão do tema nos planos de educação. Mas, como debater para juventude sobre o assunto? Tem que ser discutido apenas dentro de casa? O professor de escola pública Sidi Schneider, que o entrevistamos nesta matéria, lamentou a reprovação, uma vez que os jovens que apresentam comportamentos não heteronormativos continuam a sofrer com o bullying e a descriminação.
“Quanto a questão voltada a diversidade sexual na escola, teve muita situações em que quis participar das brincadeiras nos grupos de meninas, pois os meninos somente queriam jogar futebol e eu nunca gostei desta prática esportiva, então fui impedido pelos professores, pois me diziam que não era atividade de menino, e que eu deveria brincar estes, pois era este meu grupo de pertença. Ao analisar estas recordações hoje recomendaria a todos que me falaram isso a ler Judith Butler e Michel Foucault, pois as brincadeiras, a formação de grupos divididos por sexo, as repreensões afirmando que algo é coisa de menina ou de menino são alguns dos meios pelos quais ensinamos nossas crianças a ser preconceituosas”, relatou o professor sobre a sua juventude e alguns comportamentos impostos pela sociedade sobre a LGBTfobia.
“Temos muito receio em discutir sobre sexualidade com as crianças e adolescentes e ignoramos muitas vezes estas discussões por medo das perguntas que podem vir destes. Quanto à moral social, vejo que esta ainda arrasta a velha sombra da sexualidade como algo pecaminoso e vergonhoso, que deve ser mantida quieta e qualquer manifestação que fuja aos seus ditames deve ser condenada. Com isso, temos a manutenção de um discurso que prega a discussão sobre diversidade sexual como algo desnecessário e até muitas vezes como algo que pode incentivar as crianças e adolescentes a serem gays”, complementou.
Para Schneider, o ser humano não traz preconceitos, mas o ambiente familiar, comunidade e grupos o corrompem. Assim, convivendo em sociedade, que surge piadas desumanas. “Ao se reproduzir a moral tradicional que condena qualquer relação que foge aos padrões heteronormativos, estamos ensinando as crianças que a diversidade sexual é algo ruim, logo estas pessoas devem ser banidas de nossa convivência social”, afirmou.
O docente apontou que o trabalho da escola é promover o respeito, a convivência social em diversos grupos e inclusive a compreensão sobre o que são as relações sociais, para que estas crianças se tornem adultos que convivam com as diferentes identidades e orientações sexuais. “Para que isto seja possível, a escola precisa discutir estes temas em sala de aula, trazendo para os alunos as consequências da homofobia e do machismo, possibilitando aos seus alunos compreender que todos somos juridicamente iguais, perante nossa Constituição, e ainda possibilitar que tragam suas dúvidas e conhecimentos apreendidos em suas comunidades para que possam ser debatidos nos novos grupos que estão se formando”.
No entanto, nenhum dos projetos em que inclui a temática LGBT foi aprovado nas três esferas públicas, parlamentares mais conservadores associaram que a inclusão do assunto é ensinar aos jovens sobre promiscuidade. “O jargão sobre a promiscuidade LGBT, se volta ao contexto histórico do nascimento da moral cristã, onde esta pregava que o sexo devia ter somente a finalidade de reprodução e povoamento social, assim o sexo entre pessoas iguais, se tornou algo abominável. No entanto, com o surgimento da AIDS, esta visão da promiscuidade se propagou no ocidente, e seu foco se voltou inclusive para os homossexuais masculinos, chamando de doença gay. Com este contexto, os LGBTs foram divulgados como pessoas promíscuas”, lamentou o Sidinei, dizendo que conhecer um pouco mais sobre o que é orientação sexual, evitaria situações danosas.
Apesar do projeto não ser aprovado, ele relata que tenta trabalhar o assunto na sala de aula. “Para contribuir com o conhecimento de meus alunos e para que estes aprendam a respeitar a diversidade sexual, também procuro trazer aulas onde discutimos sobre o machismo e a homofobia em nosso dia-a-dia: estas aulas não se focam somente nas situações preconceituosas, e sim, também na legislação que no decorrer da história emancipou a mulher e os homossexuais, para que assim, os alunos entendam que a sociedade atual não é algo pronto, mas vem de uma série de lutas, discussões, manifestações e brigas por direitos.”.
O Schneider admitiu em entrevista que já presenciou uma cena, quando um aluno foi chamado de “viado” e quando uma adolescente travesti chegou na sala de aula para apresentação de um trabalho. Ao presenciar essas duas cenas, Sidi resolveu debater com os estudantes sobre o porquê das pessoas não podiam vestir ou agir como quiserem. “Hoje vejo que nossas escolas têm a necessidade de buscar a integração dos alunos, trazendo para estes, seja na sala de aula ou no intervalo, a escola como um espaço democrático, onde todos devem ser vistos com respeito e devem ter a possibilidade de integrar novos grupos, pois, como dito, a escola não é uma instituição isolada da comunidade em que se localiza, mas sim é sua extensão, e nesta os alunos passam boa parte de sua infância e adolescência aprendendo sobre convivência social.”
A discussão sobre ser LGBT, no entanto, trouxe algumas oportunidades. “Lá comentei sobre direitos sociais e também sobre a homofobia que se encontra em nosso dia-a-dia, esclarecendo a todos que mesmo que não aceitassem o modo de se vestir, de falar ou de se portar, era necessário respeitar a identidade que estava se discutindo no momento”.
Além disso, estimulou a participação de alunos LGBTs dentro da sala de aula, no qual muitas vezes os viu excluídos na escola e ajudou estimular que eles procurem amizades por colegas que passem pela mesma situação de preconceito. “Ao vivenciar estas situações sempre procurei chamar estes meninos e meninas para conversar nos grupinhos que se formavam no corredor ou refeitório, buscava integrá-los aos outros alunos, mostrando aos demais que seu colega, tem muito a contribuir e que o fato de sua orientação sexual ser diferente não o torna menos capaz de bater um bom papo, de trocar confidencias ou mesmo de aprender e ensinar algo com os demais integrantes da escola”.
E os pais? Sidi contou que os pais o parabenizam por sua atitude. “Muitos deles me contam que seus filhos comentam os conteúdos trabalhados em casa e me falam que eles dão muita importância para as várias discussões que envolvem os temas sociais. Também já tive várias conversas com pais que me disseram que era importante seus filhos conversarem sobre temas como homofobia e machismo, pois muitas vezes eles não sabiam o que responder e com as discussões em sala de aula os adolescentes puderam esclarecer suas dúvidas”, finalizou.
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