Quanto vale uma cortina de fumaça? Para alguns vereadores de Natal, aparentemente, vale a tentativa de cassar o mandato de Brisa Bracchi (PT). O processo contra a parlamentar é conduzido sob um discurso de moralidade, mas o pano de fundo revela muito mais sobre os interesses e os medos da política local.
Brisa tem denunciado a hipocrisia da Câmara Municipal ao apontar questões centrais, como favor a renovação da Câmara, contra o conservadorismo e políticas a favor das minorias. Em contraste, há vereadores que utilizam o nome de Deus em vão, pregam valores heteronormativos como se fosse a coisa mais certa (com perfil no Grindr) e ostentam riquezas, mas frequentam festas duvidosas (promove festas de aniversário para autopromoção) e, muitas vezes, envolvidos em esquemas de corrupção.
Ao falar de corrupção, é inevitável citar que muitos desses vereadores estão diretamente ligados à terceirização das UPAs, geridas por Organizações Sociais. Os relatórios do Tribunal de Contas do Estado (TCE) já apontaram as primeiras irregularidades. Talvez, não seria o caso de uma nova “Operação Assepsia”?
O escândalo político revelou problemas também nos AMEs (atuais Unidades Básicas de Saúde) e UPAs, envolvendo figuras intimamente ligadas a vereadores e até nomes ligados à primeira Secretaria Municipal de Saúde da gestão de Micarla. A mesma titular da pasta é sogra de um dos vereadores. Por falar em Micarla de Sousa, a ex-prefeita, por exemplo, deixou a gestão em meio de uma forte rejeição e quase foi presa; em seguida, Paulinho Freire assumiu a Prefeitura por alguns dias.
Em 2012, o secretário municipal de Planejamento de Natal, Antônio Luna, e o ex-secretário de Saúde de Natal, Thiago Trindade foram para cadeia (um dos que assumiram a pasta). O adjunto de Luna, na época, hoje é vereador de Natal. Também recebeu voz de prisão foi o procurador do Município, Alexandre Magno Alves de Souza.
A oposição completo já falou que iria investigar os contratos das UPAs e falhas na prestação de contas dessas organizações, apontado em relatórios do TCE. E, sobretudo, o receio de que ela alcance voos maiores na política, como uma cadeira na Assembleia Legislativa ou na Câmara Federal.
É justamente esse último ponto que assusta. Pesquisas já indicavam boas chances de Brisa conquistar uma vaga de deputada. Sua vitória significaria fortalecer a representatividade da esquerda potiguar. E, de quebra, ampliar a bancada federal com Natália Bonavides, que já desponta para um futuro terceiro mandato. Para os setores conservadores, isto é uma ameaça direta.
Não adianta usar argumentos coletados em discursos de Schopenhauer (fonte direta do falecido charlatão e pseudo-filósofo Olavo de Carvalho) dizendo que ela usou recurso público para celebrar a prisão de Bolsonaro.
O que está em jogo, portanto, não é apenas o mandato de uma vereadora, mas o direito da população de ter vozes dissonantes na Câmara. Brisa representa setores historicamente marginalizados: mulheres, juventude, comunidade LGBT e defensores de pautas progressistas.
Finalizando, é preciso reconhecer que a tentativa de cassar Brisa pode ter efeito contrário. Assim como ocorreu com outras lideranças perseguidas, ela pode sair ainda mais fortalecida, transformando-se em símbolo de resistência e inspiração para novos movimentos políticos. Algo que aconteceu com Renato Freitas, no Paraná. A história mostra que, muitas vezes, a cassação é apenas o estopim para a ascensão. E, neste caso, a oposição pode estar cavando seu próprio fracasso político.




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