A partir desta quinta-feira (23), o caso de Anna Lívia Salves (foto acima do título), morta pelo ex-marido enquanto amamentava o filho, terá seu caso julgado. O julgamento de Felipe Cunha Pinto, nome do criminoso que tirou a vida da mãe do seu filho, acontecerá no Fórum de São Gonçalo do Amarante. Dos feminicídios que aconteceram no ano passado, este foi o único, até o momento que foi julgado.
Os familiares da jovem convocaram as pessoas para ficar em frente ao tribunal para pedir justiça.
“Anna, assim como outras tantas mulheres, foi vítima de violência doméstica, sofreu diversos tipos de abuso. Quando finalmente conseguiu se separar, sentiu o ódio daquele que acreditava controlar sua vida. O crime de feminicídio cometido por seu ex-companheiro deixou mais uma dolorosa marca do machismo que sufoca nossa sociedade.”, disse os familiares em nota.
Entenda o Caso
A Anna Lívia Salves, de 18 anos, foi assassinada a facadas pelo ex-marido enquanto amamentava o filho do casal, um bebê de seis meses. Ela morreu dentro da casa da ex-sogra. O ex-companheiro dela, Felipe Cunha Pinto, também de 19 anos, se entregou no Batalhão da Polícia Militar e confessou o crime.
De acordo com a Polícia Militar, Ana Lívia foi até a casa da sogra – na mesma rua onde morava – para amamentar o filho de seis meses que estava com o pai. Enquanto ela amamentava o bebê foi atingida por vários golpes de faca. O suspeito fugiu correndo. O Samu foi acionado, mas ao chegar ao local foi constatada a morte de Ana Lívia.
A mãe chegou a publicar uma carta desabafando, que pode ser lida a seguir:
Hoje, junto-me a milhares de mães que tiveram a vida de suas filhas interrompidas brutalmente. Anna Lívia, minha filhinha tão amada, criada com tanto amor, carinho, cuidado, dedicação. Em sua adolescência, se apaixonou, namorou, criou expectativas, planejou. Anna queria ter uma família, criar seu filho junto ao pai. Ela tinha sonhos e planos. Ela não conseguiu realizar seus sonhos como planejava. Minha filha sofreu, durante muito tempo, agressões físicas e psicológicas. Ela aguentou calada, ela tinha esperança de criar seu filho junto ao pai. Ela tentou. Ela só queria sua tão sonhada família. Anna Lívia não conseguiu. Foi em Kauã, seu grande amor, seu bem maior, que ela encontrou forças para tentar sair desse relacionamento frustrado. Ela estava tentando reviver, recomeçar. Fazia tempo que eu não via minha filha tão linda, uma mãe, cuidadosa, amorosa. Dessa vez seus sonhos foram interrompidos definitivamente. Sua vida foi interrompida. O ódio, a intolerância, a monstruosidade levaram minha filha de mim. Deixou um filho sem mãe (e pai). Eu estou despedaçada, procurando forças para juntar os cacos da minha vida. Que Deus me dê forças para cuidar de Kauã, para dar-lhe muito amor, todo o cuidado, como minha filha faria. Que Deus me dê forças para lutar por justiça.”.
O que é Feminicídio
Sabe aquele crime que dizem que o homem matou a mulher por motivo passional? Ele tem o nome e se chama feminicídio. O Brasil é o quinto país em que parentes do sexo masculino mata a mulher.
No Brasil, a taxa de feminicídios é de 4,8 para 100 mil mulheres – a quinta maior no mundo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Ampliando para o Nordeste, a taxa sobre de 6 para cada 100 mil, mesmo valor no Rio Grande do Norte, o 16º estado que mais mata mulheres.
Em 2015, o Mapa da Violência sobre homicídios entre o público feminino revelou que, de 2003 a 2013, o número de assassinatos de mulheres negras cresceu 54%, passando de 1.864 para 2.875.
Na mesma década, foi registrado um aumento de 190,9% na vitimização de negras, índice que resulta da relação entre as taxas de mortalidade branca e negra. Para o mesmo período, a quantidade anual de homicídios de mulheres brancas caiu 9,8%, saindo de 1.747 em 2003 para 1.576 em 2013.
Do total de feminicídios registrados em 2013, 33,2% dos homicidas eram parceiros ou ex-parceiros das vítimas. Portanto, os quatro casos no RN citados encaixam nesta estatística. Ressaltando que o crime também pode ser provocado por um membro da família.
Em parceria com o governo brasileiro e o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), a ONU Mulheres publicou em abril deste ano um documento, que contém recomendações para a revisão dos procedimentos de perícia, polícia, saúde e justiça que lidam com ocorrências de feminicídio. O objetivo é adequar a resposta de indivíduos e instituições aos assassinatos de mulheres, a fim de assegurar os direitos humanos das vítimas à justiça, à verdade e à memória.
Em 2015, o Governo Federal criou a Lei do Feminicídio, que alterou o Código Penal brasileiro ao tipificar esse crime. Na nova legislação, a violência doméstica e familiar e o menosprezo ou discriminação à condição de mulher são descritos como elementos de violência de gênero e integram o crime mencionado.
Mas, e a lei Maria da Penha? Estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) avaliou o impacto da Lei Maria da Penha sobre a mortalidade de mulheres por agressões, por meio de estudo de séries temporais.
Constatou-se que não houve impacto, ou seja, não houve redução das taxas anuais de mortalidade, comparando-se os períodos antes e depois da vigência da Lei. As taxas de mortalidade por 100 mil mulheres foram 5,28 no período 2001-2006 (antes) e 5,22 em 2007-2011 (depois). Observou-se sutil decréscimo da taxa no ano 2007, imediatamente após a vigência da Lei, e, nos últimos anos, o retorno desses valores aos patamares registrados no início do período.
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