Nos últimos dias, eu li novamente “O Cortiço”, romance naturalista do brasileiro Aluísio Azevedo publicado em 1890. A obra denuncia a exploração e as péssimas condições de vida dos moradores das estalagens ou dos cortiços cariocas do final do século XIX, onde consegue sobreviver “quem tem mais condições”. Ainda é a nossa realidade, após 126 anos de sua publicação.
Isto me lembrou o que aconteceu nos últimos dias na cidade, onde houve o aumento da repercussão de homicídios, principalmente na área considerada “mais pobre”. A Zona Norte, para quem não sabe, tem uma área onde possui várias comunidades vivendo em condições terríveis e, por outro lado, possui os bairros em ascensão, onde vivem famílias de classe média.
A Karol e o Ronaldo fazem parte desta área e ambos foram vítimas da violência nesta semana, com algumas ressalvas.
A desigualdade social faz com que as pessoas cometam “loucuras”, melhor, crimes pesados, e tenham acesso ao que não presta.
Esses lugares de contraste geralmente é um terreno fértil para crimes “gerado pela inveja dos outros”, incluindo homicídios. Isto é horrível, pois na teoria todos deveriam ter acesso aos mesmos equipamentos, escola, livros, baladas e dentre outras coisas. Porém, isto não existe, pois pisam uns sobre os outros.
Muitos de nós pensamos nesta seguinte teoria: “Se me ferrou, eu vou ferrar os outros”. Aí nascem os roubos, homicídios, estupros, latrocínios e dentre outras coisas. Nunca paramos para perguntar: O que tornou a pessoa assim? Foi a situação familiar? Quais eram seus amigos? Vivia numa família abusiva?
Ninguém está defendendo criminoso, só precisei fazer esta análise para que evitem outros homicidas e ladrões. Alguns podem falar: “Mas, tem gente que é psicopata e é frio, malvado mesmo, mata ou rouba por prazer. Eles precisam ser mortos e punidos.”. Sim, se cometeram crime, precisam ser punidos e analisados, mas também precisam de tratamento sério.
Psicopatia é uma doença mental, nos quais poucos tem acesso ao psiquiatra e isto é outro assunto a ser discutido. Um ótimo documentário para falar de gente má desde jovem é “A Ira de Um Anjo”. Vejam, muito bom. O foco deste artigo, todavia, é sobre problemas urbanos, que resulta no aumento de crimes.
Nesta semana, a Karol foi fazer uma caminhada com a irmã na Avenida Itapetinga, zona Norte da cidade, usando seus fones de ouvido para escutar suas músicas prediletas no celular. Ganância de uma dupla vendo isso e foi abordar a jovem, que foi alvejada e não resistiu aos ferimentos. A vida dela acabou por causa de um celular. Gerou comoção e caminhadas pedindo a paz.
Ao contrário de muitos, meu sentimento não era de revolta pelo crime. Eu criei reflexões profundas sobre o assunto, não desejei morte de ninguém ou linchar alguém e muito menos tirar foto do cadáver e espalhar nas redes sociais, fiquei pensando sobre o que levou para este crime e o porquê dessa situação chegar a este ponto. Não quero ser aquela que vai dar lucro para empresas que estão ganhando com o medo das pessoas. Podia ser eu ou algum conhecido, vítima da ganância da nossa sociedade.
Filha de um socorrista do Serviço Móvel de Atendimento de Urgência (Samu), a jovem lutava pelos direitos humanos, fim da violência e, principalmente, as causas das mulheres, se olhar as últimas publicações da garota nas redes sociais. Em outras postagens, ela afirmou ter sido roubada (roubaram os cadernos e apostilas dela na rua, quando estava prestando vestibular) e criticou a falta de atenção na parte de segurança pública, criação de políticas aos jovens da periferia e das comunidades mais carentes. O caso dela não será esquecido, jamais, ela teve que morrer para criar uma comoção e ampliar debates. Por que falo isso? Ela foi vítima da violência, da desigualdade social e da cobiça humana.
Sim, a cobiça, o lucro, inveja e a ganância gera sentimentos terríveis nas pessoas. Ao mesmo tempo, quando a bomba estoura, mais sentimentos horríveis acontecem, como ódio, revolta, medo ou algo do tipo. Falar que vão ficar isolados numa casa cheia de cerca elétrica, grades e portões eletrônicos não mudará a situação, pelo contrário, gerará mais interesse a fazer crimes a saber “o porquê estão escondendo o ouro”.
O que devemos fazer é estimular criar atendimentos dignos para comunidades mais carentes, debater sobre o uso de entorpecentes (sim, a droga estimula o crescimento da violência), conhecer de verdade o problema da violência, gerar emprego e educação. Criar acesso para todos, independentemente de ser para ajuda pública, privada ou os dois.
Um exemplo disso é o Ronaldo Cordeiro de Morais, 18 anos, morto neste domingo (24), após ser alvejado na favela do Mosquito. Vivia na Rua Potengi, no bairro das Quintas. Sua casa é próxima do mangue do rio Potengi, banheiro com condições péssimas e vive com um monte de gente: pai, mãe, esposa, filha e sobrinhos.
É filho de uma empregada e de um zelador, o jovem queria as coisas que não tinham, virou infrator, largou a escola, começou a andar com más companhias e passou a cometer pequenos furtos, além de traficar drogas ainda nos primeiros anos de sua adolescência. Seu irmão mais velho também entrou no crime.
Ficou conhecido pelo bordão “Que onda é essa?”, o garoto de apenas de 18 anos ganhou popularidade depois de aparecer no Patrulha Policial, da TV Ponta Negra. Na reportagem, Ronaldo aparece tratando como brincadeira o fato de estar preso por ter roubado um desodorante para vender com a finalidade de comprar comida para filha. A primeira postagem do vídeo no Youtube já registra mais de 200 mil visualizações, o que impulsionou a popularidade do jovem infrator no Brasil todo.
Após ter “virado meme”, ele tentou largar a vida, começou a vender ginga com tapioca na Praia de Ponta Negra e começou a ser procurado para tentar “apagar o lado ruim”. Entretanto, a inveja de ter ficado melhor, a cobiça dos traficantes em lucrar e sua vida passada fez com que ele fosse morto, sem direito a melhora. Na frente da esposa e da filha. Virou outra estatística da violência, o “ex-bandido” morreu.
Não houve protesto ou mensagens de indignação, ouviu e vi muitas chacotas, a sua foto já morto foi espalhada nas redes sociais e outros, com bom senso, criticaram essa ação jocosa e ficaram tristes pelas sua perda.
Concordo com crítica de Karol, feita em 2013, no qual aponta que as pessoas da periferia tem poucos destinos para “se dar bem”. Ronaldo poderia virar exceção, conseguir um emprego, sustentar a filhinha de forma digna e não foi o que aconteceu. Quem vive na periferia parece que o destino é cadeia ou cemitério ou procurar outras opções.
Imagina quantos Antônios, Ronaldos, Karols e Rodrigos que viraram uma estática do Instituto Técnico-Científico de Polícia? Quantos morreram por dívida da droga? Quantos morreram por causa dessa cobiça terríveL por dinheiro e entorpecentes?
Muitos acham que só aumentar o policiamento, ter arma toda hora ou matar gente resolverá a violência. Não, não vai, pois precisa é educar e criar oportunidades para aqueles que principalmente vivem nas áreas periféricas. Portanto, a gente tem que enxergar não só os dois citados neste texto, mas também aqueles outros que são mortos todos os dias por conta da violência.
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