Uma noite de carnaval no Walfredo Gurgel

Uma noite de carnaval no Walfredo Gurgel

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Lembra que falei que torci o pé no meio do “Acorda, Clubber”? Agora vem a segunda parte da história, que é uma noite no Walfredo Gurgel. Após ter meu plano de saúde negar meu atendimento por ter atrasado dois dias o boleto, eu fui salva pelo Sistema Único de Saúde (SUS), pois ou ficaria os quatro dias relinchando de dor ou precisava saber o que estava pegando.

Como falei no texto anterior, o enfermeiro e bombeiro civil alegou que precisava imobilizar o pé. Só saquei que a torção foi feia depois que vi o meu pé e estava com dois edemas em cada lado do tornozelo. Parecia que implantei duas bolas de frescobol. A foto acima, logo, mostra a foto de como tava meu pé na fila do Walfredo.

No Hospital Particular demorou uma eternidade para colocar uma cadeira de roda, fiquei andando igual saci e vendo povo me julgando dos pés a cabeça. “Sim, eu torci o pé no bloco de carnaval”, disse para quebrar a torta de climão. No mesmo hospital tinha duas freiras me julgando, devia ter pedindo para elas abençoarem meu tornozelo para curar mais rápido.

Chega de digressão e salta para o Walfredo Gurgel. O maqueiro viu e já colocou uma cadeira de rodas para sentar. O domingo de carnaval estava também agitado, visto que assim que cheguei tinha uma menina em coma alcoólico, dois homens que se acidentaram de moto e estavam todo ralados, um outro homem com fratura exposta após cair de moto com sua tia após bater num outro veículo de duas rodas (levando bronca da mãe) e um bebê de pé torcido.

Tinha outros também que estavam acidentados e fantasiados como eu, destaque para um folião que tava com abadá de um bloco chamado “cu de cana”.

Fazer a ficha no Carnaval do Walfredo Gurgel

O primeiro passo foi fazer a triagem neste carnaval no Hospital Walfredo Gurgel, mas mãe da paciente do coma alcoólico estava gritando de desespero após a menina ter convulsão e isso mobilizou o hospital inteiro para acalmar a genitora. Enquanto isso, minha irmã foi tentar me acalmar e também a irmã dela que estava com medo. Após a situação esteve sobcontrole, fui fazer minha ficha e enviei toda documentação.

O inchaço

Após as perguntas básicas, eu voltei para recepção e fiz a ficha, no qual rapidamente orientou que fosse esperar o atendimento do ortopedista.

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O Ortopedista

O atendimento com ortopedista não demorou e já constatou que meu pé estava danificado só no olhar. Após fazer umas perguntas básicas, ele viu que tinha que fazer raio-x só para saber se houve fratura, uma vez que meu pé estava inchado.

Então, me encaminharam para a sala de raio-x, onde fiquei na fila e duas pessoas que entraram na mesma hora que eu estava na minha frente. Uma das acompanhantes já me viu maquiada para o bloco disse: “Nossa, sua maquiagem está bonita, que droga que aconteceu contigo”, disse. Agradeci e comentei que pelo menos tive uma história de folia de momo.

Minha irmã, que estava comigo neste carnaval do Walfredo Gurgel, disse que mal chegou na festa quando contei a novidade da torção do pé, mas a acompanhante falou que fazia parte. Após fazer o raio-x, comemoramos que os ossos do meu pé estavam intactos e que não faria alguma cirurgia e fomos entregar ao plantonista.

Ele perguntou se conseguiria ficar de pé, foi a pisada mais dolorida da história, parecia que meu pé explodiria a qualquer momento. Então, ele prontamente disse: “Vai fazer uma tomografia para saber como está a gravidade do edema”, relatou. Aí foi neste momento que conheci o lado verdadeiro do Walfredo Gurgel.

A fila da Tomografia

O que mais chegou ser caótico do Walfredo Gurgel, do mesmo que a gente ver nos noticiários, foi na fila da tomografia, onde uns 10 pacientes esperaram no corredor. A madrugada avançara e pacientes acidentados de todo o interior do RN apareciam. Desesperados, os plantonistas tinham que escolher como prioridade os casos mais graves e como meu pé era apenas uma torção, demorei quase duas horas para atendimento.

Lá, eu vi todo tipo de desespero, ver parentes chorando ao ver aquele paciente naquele estado, medo da demora ser tarde demais, paciente ser dopado porque queria sair da maca de qualquer jeito e um corpo chegando ao necrotério. Foi um verdadeiro teste para quem era ansioso, mas é isso era o cotidiano do Walfredo. O maqueiro que tava conversando com os pacientes, disse que era o esperado, uma vez que o domingo de carnaval sempre período que tem mais festas e agitação.

“”Em dias comuns, período diurno é o mais agitado, porque as pessoas estão na rua e raramente sai de casa a noite”, justificou. Um enfermeiro discordou, disse que a madrugada de carnaval sempre era mais agitado. “Madrugada, gente bêbada e logo, mais acidentes”, disse o profissional se referindo ao Walfredo como hospital conhecido pela ortopedia e atendimento de urgência e emergência.

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Após uma hora e meia e muito conversa, consegui a tomografia e os equipamentos eram bem modernos. Mesmo que a estrutura do hospital precisa de reforma, todo mundo teve seu atendimento. Após a tomografia, fui voltar ao ortopedista e mais uma fila, porque aumentou a quantidade de pessoas que quebraram seus membros e se acidentaram.

A última fila no Carnaval do Walfredo Gurgel

Carnaval de botinha

Nesta última fila, a consulta demorou um pouco, pois os ortopedistas foram fazer cirurgia aos pacientes. Os enfermeiros tentaram acalmar os pacientes, fazendo os primeiros atendimentos enquanto alguns estavam relinchando de dor por conta de suas fraturas. Mas, com a ajuda e boa vontade, organizamos a ordem de entrada para ninguém furar a fila.

Lembra da mãe que ficou bronca no filho após acidente de moto? Elas estava na fila continuando dando bronca e eu só imaginando a bronca que minha mãe daria no dia seguinte. A mesma riu quando contei que mainha iria falar coisas assim: “Coisa de mãe, mesmo, mas estou aliviada que ele só teve essa fratura e vai fazer cirurgia. Só fazer, recuperar e casa”, disse.

O médico chegou e o primeiro paciente entrou. Neste período, ele foi ajeitar o osso da fratura exposta, fazendo com que a gente ouvisse todos os tipos de grito e rezando para não receber gesso.

Fui atendida e o médico disse que tomografia constatou apenas torção e que não precisaria de gesso (ufa!), porém receitou anti-inflamatório, spray e bota imobilizador. Como resultado, esta foi minha aventura como paciente do Sistema Único de Saúde (SUS) e agora estou andando de botinha por aí.

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Sobre lara

Jornalista e publicitária formada pela UFRN, começou despretensiosamente com um blog para treinar seu lado repórter e virou sua vitrine. Além disso, é mestranda em psicologia na UnP e ainda é doida o suficiente para começar mestrado em Estudo da Mídia na UFRN. Saiba mais sobre esta brechadora.

Desenho: @umsamurai.



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