Mês: fevereiro 2018

  • Por que não conheci Chico Doido de Caicó?

    Por que não conheci Chico Doido de Caicó?

    Não existe alguma foto dele. Nem uma 3×4. Por isso, eu coloquei a imagem de sua cidade: Caicó, também conhecida como a capital do Seridó. Poeta? Troll? Zoeiro? Personagem? Mito? São muitos questionamentos em torno do escritor Chico Doido de Caicó, autor potiguar que eu conheci durante o evento “Você é o que lê“,  que aconteceu em dezembro do ano passado, no Teatro Riachuelo, mencionado por Xico Sá, um dos participantes. Atualmente, ele é uma figura tão mítica quanto o Seu Lunga. Assim que eu cheguei em casa, eu rapidamente fui pesquisar os poemas do dito cujo (alguns fariam as músicas de “Cabrito” ser hino gospel) e alguns vou postar a seguir:

    A rapariga que eu mais quis bem

    Me dava dinheiro

    Me dava cigarro

    Me dava cafuné

    Me dava cachaça

    Me dava embalo na rede

    Me dava tudo

    Só não me dava o cu.

    Ainda tem esse daqui:

    É pecado, ela dizia, é pecado

    E logo em seguida se engasgava

    Com o meu pau todinho em sua boca.

    Como vocês podem perceber, Chido Doido era bem desbocado, mas ao mesmo tempo retratava o cotidiano de um homem machista, daqueles que xinga até a mulher quando leva um fora e crítica a hipocrisia de comportamento sexual entre homens e mulheres. Há contradições. Mas, ao mesmo tempo, você começa a rir de uma pessoa que consegue falar tudo de forma direta e sem devaneios. Além disso, ele consegue fazer com que todas as coisas sejam relacionadas com putaria. Veja mais poemas:

    A primeira vez

    Que eu vi o mar foi em Natal.

    Vôtes! Ele engolia o Potengi

    Como uma caninana engole um sapo

    Como uma boceta engole um pau.

    Veja esse:

    Quero que o meu último poema

    Tenha a minha visão do paraíso:

    Uma gruta cor de rosa

    Cheia de musgo e leite, leite e musgo

    Onde penetrarei com a minha tesão de eternidade.

    Mas também ele podia falar de tudo, desde esporte, política, Nordeste, dentre outros assuntos.

    Prezada Dona Chica de Igapó:
    Venho, de novo respeitosamente,
    Com a minha filosopotia pai d’égua,
    Solicitar a tua quente goiabinha
    Para o meu particular uso e abuso.
    Prometo que saberei borogodeá-la
    Sem mais, sem menos, sem talvez
    Pelo menos uma vez por mês
    Limeirando uma, duas ou três.
    Do teu Chico que nasceu em Caicó
    País de cabra macho e de jumentos
    Que adoram apreciar o luscofusco
    De tangerinas e lobisomens. Arre égua,
    Acabo de me lembrar agora: o Peru
    Ganhou a guerra da Coréia
    Com a força de sua idéia.
    Passa, passa, passatempo,
    Tempo, tempo, passa lento,
    Jesus Cristo nasceu em Caicó
    E morreu em Jardim do Seridó
    Assim diz o Novo Testamento.

    Por muito tempo, o Chico Doido de Caicó era uma figura bastante underground na literatura potiguar. Parecia que era proibido falar dele, por fazer analogias ao sexo e conter muito palavrão. Porém, a internet e os diversos blogs de literatura ajudaram ressuscitar os seus poemas, no qual a maioria estavam reunidos em um simples caderno e foram espalhados para o mundo. Na internet é muito fácil encontrar poemas que dizem ser feitos por ele.

    Porém, os escritores Nei Leandro de Castro e Moacy Cirne conseguiu reunir 69 poemas e publicaram em um livro, no ano de 2002, cuja capa é essa daqui e infelizmente é difícil de encontrar para vender:

    Pouco se sabe do Chico Doido de Caicó, as poucas informações que temos dele é que nasceu em Caicó em 1922 e faleceu na cidade de Duque de Caxias em 1991. Isto mostra que não precisa ter uma grande biografia para deixar as suas marcas na literatura.

    O seu nome era Francisco Manoel de Souza Forte e serviu a Marinha nos anos 40. Na década de 50 morou em Natal. Mas, nos seus últimos anos, divulgava os seus poemas na Feira de São Cristovão, no Rio de Janeiro. Na década de 90, os seus poemas foram publicados no “Balaio Poema”, de editoria do Moacy Cine, que conheceu Chico Doido por Nei Leandro de Castro. Depois do livro de 2002, o Chico virou tema de peça e teve um artigo publicado por ele no Le Monde.